Um discurso de Lukashenko no dia 31 de março oferece uma entrada para alguns motivos ideológicos que são evocados por seu governo e em alguma medida pelo governo da Rússia.

“A unidade do povo é condição para a soberania genuína do Estado (…) Nós bielorrussos mostramos isso nos momentos cruciais da história. Foi a unidade que nos deu força para prevalecer sobre inimigos e circunstâncias”. O grande exemplo seria a Grande Guerra Patriótica, que Lukashenko evocou para fazer paralelos com a aliança contemporânea com a Rússia contra a OTAN e a Ucrânia: “quem esteve conosco ombro-a-ombro nas florestas e pântanos? Os eslavos, os russos”.

Em seguida são listadas outras tragédias: anos difíceis do pós-guerra, “o maligno anos 90”, as crises mundiais e a pandemia. “Juntos sobrevivemos a investida dos modelos liberais. Nós afatamos o país da ruína, do abismo. Preservamos a continuidade de eras históricas e tradições”.

A implicação ideológica dessa retórica é de que a existência do Estado independente e soberano é ciclicamente ameaçada por catástrofes e que o bom governo é aquele que se preserva perante essas catástrofes e escolhe seus verdadeiros aliados. Sobre a continuidade histórica, Lukashenko também se referiu aos momentos de 1917 (Revolução de Outubro) e de 1939 (reunificação das terras bielorrussas que haviam sido tomadas pela Polônia) como fundamentos da existência nacional de Belarus enquanto Estado.

Temos aqui uma combinação de um tipo de discurso em certa medida nacional-conservador, voltado mais para a preservação do Estado do que necessariamente de costumes ou de uma ordem tradicional, ao mesmo tempo que tem entre as ameaças enumeradas os problemas sociais associados aos choques econômicos do neoliberalismo – normalmente o conservadorismo está associado a preservação da ordem da propriedade privada como uma ordem de justiça independente dos resultados sociais, o que não é o caso aqui: a perspectiva de “prudência” e “longa continuidade” é acompanhada pela ideia de proteção de um tipo de Estado social.

Além da pretensão de fornecer uma perspectiva histórica de formação de um povo unificado e independente, Lukashenko realiza com poucas frases as manobras ideológicas que caracterizaram anos de seu governo: a defesa da União Soviética como componente da independência de Belarus, a posição de defensor da independência da Belarus pós soviético como aliada e não como oposição à Rússia.

Fonte

https://eng.belta.by/president/view/peoples-unity-identified-as-key-condition-for-genuine-sovereignty-of-belarusian-state-157734-2023/ “People’s unity identified as key condition for genuine sovereignty of Belarusian state”, 31/03/2023

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