Na revista Foreign Affairs, Asfandyar Mir e Andrew Watkins escreveram um artigo relatando os sucessos recentes da política externa do Taliban afegão e o consequente fracasso da tentativa dos Estados Unidos de impor isolamento diplomático. A revista ligada ao think tank Council of Foreign Relations é um espaço importante de circulação de membros da elite do poder federal nos Estados Unidos e normalmente exibe as tendências políticas que influenciarão o governo.

A linha de argumentação funciona pela convergência de dois pontos: os Estados Unidos não podem isolar o Taliban pois não conseguem e não podem isolar o Taliban pois não deveriam, já que um engajamento com os governantes do Afeganistão seria mais produtivo por outros meios.

A China reconheceu um embaixador afegão nomeado pelo Taliban em uma cerimônia que contou com a participação do próprio Xi Jinping, que recebeu credenciais de outros 309 diplomatas de diversos países. A Índia reabriu sua embaixada em Cabul no ano de 2022 e retomou um grande projeto de investimento na infraestrutura do país. Diplomatas russos também participaram de eventos com autoridades afegãs, mas nem a Rússia e nem a China deram o passo final de reconhecer formalmente o regime que governa o país.

A política dos EUA de punir o Taliban usando o não-reconhecimento diplomático para pressionar em questões como direitos humanos até agora não funcionou, segundo os autores — pelo contrário, o grupo se consolidou no poder e ampliou sua resistência a esse tipo de pressão para alterar suas políticas. “O não-reconhecimento não é mais uma ferramenta coerciva credível, e se os Estados Unidos querem influenciar o comportamento do Taliban devem encontrar outros meios”, argumentam, acrescentando que os EUA já fracassaram nas tentativas de isolar Bashar al-Assad da Síria e Vladimir Putin da Rússia.

Ministros do exterior da Rússia, China, Paquistão e Irão já se encontraram em Samarcanda, Uzbequistão, para discutir soluções de problemas ligados ao Afeganistão, efetivamente estabelecendo um formato distinto do que os Estados Unidos propõem para a comunidade internacional. Os autores da Foreign Affairs ainda responderam ao argumento de que o Taliban teria “cedido à pressão” e por isso estaria combatendo o grupo terrorista ISIS-Khorasan: nesse caso os atuais governantes afegãos estariam somente perseguindo seus próprios interesses.

O texto deixa claro que existem cabeças na política dos Estados Unidos que pensam que seria melhor para seu país competir pela atenção do Taliban através de engajamento construtivo, para não ficar de fora do que acontece na região e ter sua própria parcela de influência no governo de Cabul.

Asfandyar Mir é especialista em Ásia e Andrew Watkins especialista em Afeganistão, ambos trabalham no United States Institute of Peace, instituição independente criada pelo Congresso dos EUA em 1984.

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